Políticas de Saúde Mental

a. Plano Nacional para a Saúde Mental

A Lei n.º 36/98 de 24 de Julho consagrou as bases da política e organização nacional da Saúde Mental para Portugal e foi poucos anos depois confirmada no Plano Nacional de Saúde Mental.60

O Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 (PNSM) foi aprovado em 24 de janeiro de 2008, pela Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 49/2008, tendo sido criada uma Coordenação Nacional para a Saúde Mental, no âmbito do Alto Comissariado da Saúde, com a responsabilidade de coordenar a sua implementação. O PNSM foi revisto e atualizado em 2012.5

Em consequência da sua aplicação considera-se:

a) A redução do número de doentes institucionalizados em hospitais psiquiátricos em 40%;

b) O encerramento do mais antigo hospital psiquiátrico do país e movimentos para a desativação de outros;

c) A criação de serviços de Saúde Mental nos hospitais gerais e lançamento de alguns novos serviços na comunidade, bem como a formação de profissionais no contexto de desenvolvimento de programas integrados para doentes mentais graves;

d) O lançamento das bases dos cuidados continuados integrados de Saúde Mental e criação dos primeiros serviços e programas residenciais neste setor;

e) A criação de novas unidades e uma nova rede de referenciação no campo da Saúde Mental da infância e adolescência;

f) O início de vários programas inovadores que permitiram integrar a Saúde Mental na luta contra a violência doméstica, o apoio aos sem-abrigo e aos jovens com problemas de adaptação e inclusão social em cooperação com os setores social, da justiça, da educação e do emprego.

b. Acesso aos cuidados de Saúde Mental

De acordo com o PNSM, «a questão do acesso aos cuidados em Saúde Mental tem sido uma das áreas mais aprofundadas nos últimos anos, estando já identificados vários dos seus determinantes: 

  • Estigma e desconhecimento face à doença mental; 
  • Escassez de recursos humanos e estruturais; 
  • Baixa prioridade em termos de opção política; 
  • Orçamento desproporcionadamente baixo para a carga das doenças implicadas; 
  • Organização desajustada dos serviços de psiquiatria, com concentração em grandes instituições centralizadas e pouco articuladas com os cuidados de saúde primários.»62

Ao longo dos anos, têm sido desenvolvidos esforços em Portugal para melhorar os cuidados de Saúde Mental. Promulgada em 1963, a lei de Bases da Saúde Mental (Lei n.º 2118, de 1963) permitiu a descentralização dos serviços através da criação de centros de Saúde Mental em todos os distritos do país e a ligação aos cuidados de saúde primários.59 A lei atual de Saúde Mental (Lei nº 36/98) e a legislação subsidiária consagram a integração da Saúde Mental no sistema geral de saúde e a transferência dos cuidados especializados para os hospitais gerais e comunitários. Foram ainda enunciados o desenvolvimento de programas e estruturas de reabilitação psicossocial, a legislação de apoio ao emprego nos anos 90 e o atual Programa Nacional para a Saúde Mental. Apesar destes avanços muito há ainda por fazer, não em termos de legislação, mas em termos da implementação no terreno da legislação existente.

A emergência da assistência psiquiátrica em Portugal e a sua evolução até aos dias de hoje está descrita num artigo publicado na International Review of Psychiatry63, onde é feita uma análise histórico-descritiva e crítica da situação da assistência psiquiátrica em Portugal.

c. Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados para a Saúde Mental

Os programas de reabilitação desenvolvidos, desde o final dos anos 90, tiveram um papel fundamental para a modernização da Saúde Mental em Portugal, sobretudo no que diz respeito às bases conceptuais, legais e organizacionais da Rede de Cuidados Continuados Integrados em Saúde Mental.60

A Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) foi formalmente criada em 2006, com o Decreto-Lei n.º 101/2006. Quatro anos mais tarde é estabelecida uma orientação específica para pessoas com doença mental grave – Decreto-Lei n.º 22/2011, de 10 de fevereiro – com o objetivo de contribuir parra «o desenvolvimento de respostas reabilitativas que atendam a situações de dependência e incapacidade psicossocial provocadas» 61.

Novas alterações legislativas introduziriam novidades na RNCCI em 2015. Com o Decreto-Lei n.º 136/2015, de 28 de julho, efetuou-se a primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 101/2006, de 6 de junho, e a segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 8/2010, de 28 de janeiro, levando à integração na RNCCI do conjunto de unidades e equipas de cuidados continuados integrados de saúde mental criado pelo Decreto-Lei n.º 8/2010, de 28 de janeiro. As unidades e equipas de saúde mental que foram autorizadas a integrar a RNCCI estão listadas no anexo III ao Despacho n.º 8320-B/2015, de 29 de julho, num total de 312 lugares. Apesar da publicação desta informação, não chegariam a entrar em funcionamento.

d. Desinstitucionalização

O processo de desinstitucionalização das pessoas com doença mental teve início em Portugal, em 2009, após a aprovação da lei atual de Saúde Mental (Lei nº 36/98) e enquadra-se num novo modelo de assistência psiquiátrica. Desde então o número de doentes institucionalizados em hospitais psiquiátricos públicos já reduziu 40% tendo sido transferidos para outras instituições na comunidade. Em consequência foram encerrados três dos principais hospitais psiquiátricos do país – Hospital Miguel Bombarda, Centro Psiquiátrico de Recuperação de Arnes e Hospital do Lorvão.64

e. Integração dos cuidados de Saúde Mental na comunidade

Graças aos esforços desenvolvidos nas últimas décadas, registaram-se alguns avanços na integração dos serviços de prestação de cuidados na área da Saúde Mental na comunidade. No entanto, em alguns aspetos essenciais, esses avanços revelam-se insuficientes, levando à constatação que existe ainda um longo caminho a percorrer para assegurar o acesso de todos a cuidados de saúde de qualidade.

Este caminho começou a ser percorrido em 2008, aquando do desenvolvimento do Plano Nacional de Saúde Mental, elaborado pelos principais stakeholders da área em Portugal, levando a um progresso significativo da transição para a prestação de cuidados de saúde na comunidade. 60

Os aspetos negativos e positivos destes avanços, bem como as barreiras à sua implementação foram sintetizadas pelo relatório Portugal Situation Analysis – 201560 do programa da União Europeia Joint Action on Mental Health And Well-Being, apresentado em 2015. Neste relatório destacava-se a aprovação da Lei de Saúde Mental, em 1998, que permitiu avanços importantes na proteção dos direitos humanos de pessoas com perturbações mentais e colocou Portugal ao mesmo nível de outros países desenvolvidos. Com esta Lei veio também o aumento do número de parcerias com organizações não-governamentais, um contributo importante na modernização dos cuidados de Saúde Mental.60

f. Desafios da Saúde Mental

Segundo o Plano de Ação para a Saúde Mental 2013-2020 da OMS65, Portugal, tal como outros países, terá quatro desafios importantes na área da Saúde Mental até 2020:

  1. Fortalecer a liderança e promover a gestão eficaz na área da Saúde Mental;
  2. Prestar serviços de Saúde Mental e sociais abrangentes, integrados e reativos inseridos nas comunidades;
  3. Implementar estratégias para a promoção e prevenção na área da Saúde Mental;
  4. Reforçar os sistemas de informação, evidência científica e investigação na área da Saúde Mental.

O plano apresenta indicadores e alvos para os Estados-membros tais como um aumento de 20% na cobertura do serviço para distúrbios mentais graves e uma redução de 10% na taxa de suicídio dos países até 202065.